sexta-feira, abril 18, 2008

PAX MEDITERRÂNICA ( MICROCOSMOS) - 1999

Falar deste poema é sensacional.
Primeiramente, de um apanhado sem lógica alguma, os versos dele vão se ajeitando e formando idéias livres para o leitor atento, intrigado ou fascinado, que compreende possibilidades incríveis de olhares sobre a vida, ou sobre fatos históricos. Eu posso dizer que já compreendi bastante deste poema, por mais que algumas pontes podem ser "viagem minha" ou "absurdo, sem lógica". Ainda, não sei se ocorrerá isto, não consegui entendê-lo como totalidade. na minha opinião, não há totalidade neste poema, pois ele fala do universo que é milhonéssimamente maior que a nossa lógica, ao que podemos entender. Se pensar que um inseto, vê milhares de cores e frequencias a mais que nós humanos. Ou, que eu existo aqui e existo lá, tudo ao mesmo tempo. Este poema é mais um reflexo dessa complexidade de nossa pequeneza.
Este poema foi feito em conjunto por mim e por minha amiga Clariana Alba, pessoa muito sensível, bastante acolhedora, envolvida com a poesia, com a natureza. Estávamos na casa do Fábião ( Fábio Peres) com ele e a Lígia (Lili Mathias), assistindo Microcosmos, filme que retrata em minúcias a relação dos animais, das plantas, das águas, do barro, do vento, do sol....com todos eles, integralmente. Assistíamos o filme e espontaneamente começamos, num jogral, a declamar versos, um após o outro. O clima era de canais abertos ao cosmos e uma percepção de envolvimento e perda do limite racional. Eu anotava os versos e depois de alguns dias, ajeitei-os, e deu este maravilhoso poema de que gosto muito.
Eram tempos da entrada na universidade, éramos calouros nesta época e da mesma turma. saudades!!! Com vocês....


PAX MEDITERRÂNICA (MICROCOSMOS)

poema composto por EMRIQI e Clariana Alba



H2O e ar não se misturam
Como um espelho abandonado
Mas se for necessário eles se unirem
Para a libélula azul se aconchegar
Ai então posso lhe contar os segredos do céu
Que é azul assim, é um espelho do mundo
Que as sombras das nuvens se façam no ar.
Que as pedras da Lua e de Marte se unam
Para dançar um balé cósmico
Verde de reflexos do lago azul
É a rã que se banha com devoção
Numa tormenta de lágrimas.
Guarda-chuvas brancos, algodões
O caracol da vida no espiral do mundo, num espiral da nuvem
O Sacrifício de Tito
Assim como se movimenta faz metrô
A nuvem que era gato virou um rato
Formigas que entram e saem, interior
Que o Kremilim da abelha se faz no mato
A flor que embala a abelha, acalenta
Pecado em minha cabeça se trâmita
Cipó de folhas fazem besouros
Cem mil pés para chegar aonde?
Que destino!
Que terra!

II

Lutar, num corpo a corpo hereditário
Desperta aos que estão dormindo
Vá Quilombo dos Palmares, a capoeira está nascendo
Luz se faz harmonia...
Comida
Alimento da terra
Sagrado
Entranhas da velhice, alimentação
Bosque encantado
Formas do tempo
Que tempo! Que formas!
Que entranhas, que velhice, que pernas
Ponto final. é só uma nuvem.
Sol...sol se pondo em algum lugar do universo, porque n'outro, ele está nascendo
Berço, berço da vida, descanse em paz no violeta da noite.

III

A noite tá vindo, né?
Se liga na noite, na madrugada...
...o horário
Vigias da noite
Crateras lunares
São tão profundas
Como eu ser humano imagino
E como as mariposas nem imaginam
Elas já sabem
Elas já sabem as respostas.
Lagos frios de Nuremberg
Faz-se um estranho provergia
Gigante tótem poderoso
Do poder se faz a ideologia.
Pianos de Bach nasceu catedral
Portal da Igreja remanescente
Espelho do espírito se faz transparente
Formas geométricas racionais
Fazem teclas de piano, fazem anéis de prata
A corrida começou
Que o lago contaminou o petróleo
Da esperança, dá luz na natureza
Esta música é um tesão.

.

terça-feira, abril 01, 2008

OS BOCAS DO INFERNO - Gregório de Matos, Eu e a Patota...



Para quem não conhece Gregório de Matos, apresento-o. Ele foi o Boca do Inferno, o poeta mais perigoso do séc. XVII na Bahia, autor de sátiras e humores ácidos frente a sociedade aristocrata colonial. Sua biografia pode ser vista no site da Wikipedia http://pt.wikipedia.org/wiki/Gregório_de_Matos.

Pelos meus conhecimentos sobre este baiano-poeta, sua figura é muito discutida em relação a sua identidade: se ele foi um nobre aristocrata que para escrever sobre a aristocracia, se refugiava no pseudônimo Gregório de Matos, e não se sabe a identidade deste aristocrata. Ou, se esta pessoa foi da alta sociedade que percorreu as ruas boêmias agarrados a prostitutas, mulheres de melhor estirpe que as primeiras, também estigmatizadas, a gozar a vida e atirar farpas. Acredita-se, pelos indícios históricos, que ele foi a segunda opção, a mim, muito mais interessante. Existe também uma dúvida sobre a origem de seus poemas, de quem os escreveram, que tem relação com esta esquiva frente ao poder dos aristocratas. Neste texto de Haroldo de Campos, pode-se melhor compreender esta história, no sitio Jornal de Poesia - http://www.revista.agulha.nom.br/har01.html.

Eu tive aulas na Unb de barroco e, eu lembro que Gregório era um boêmio, de andar caído várias vezes pelas calçadas. Se eu tivesse conhecido este camarada, creio que seríamos grandes amigos, a vociferar verdades nuas, armas de afugentar burgueses, cagados pelos marginais loucos e bêbedos. Momento, onde a rua pertence aos de alma quente, que gozam o corpo celeste das estrelas e da via Láctea, impulsionados pelos cantos líricos da sacanagem, do falar baixo, em tons altos, a clamar e xingar honras a nobres poetas boêmios do passado, perpetuando a poesia dessas almas livres. A gozar também, das pernas rígidas e dos olhares desconfiados da instituição familiar, religiosa e burocrática. É o momento da rua, da música, do encontro, das carnes púdicas. Eu, Gregório (o Boca de Brasa), e a patota toda, a esticar o bigode, a exalar o cheiro da rua, misturado, e a contar piadas limpas da verdade.

Agarrados um ao outro, ombros amigos a duas pilastras de sangue etanoíco, a caminhar pelos Barrios e a soltar uma poesia após outra, e a clamar cada uma com o gargalhar de Dioniso e a levantar a “botilla de águqardiente”, e a tratar delicadamente às prostitutas, a convidá-las para cantar em outro bar, Gregório, diria:

“EMRIQI, tenho um poema

A UMA FREIRA, QUE SATIRIZANDO A DELGADA FISIONOMIA DO POETA, LHE CHAMOU PICA-FLOR.

Se Pica-flor me chamais,
Pica-flor aceito ser,
mas resta agora saber,
se no nome, que me dais,
meteis a flor, que guardais
no passarinho melhor!
se me dais este favor,
sendo só de mim o Pica,
e o mais vosso, claro fica,
que fico então Pica flor.

Rá-ráraáráraááá !!! “Gregório – disse eu – o que dirá os deuses da sacanagem ?” “Somos nós, rárar´rar´rará, os poucos que não andam adormecidos!!! – esbraveja O Boca.

E não podia faltar, eu emendo com um poema meu:

“Veja Gregório...

PRIMAVERA

Tu já deves ter visto
Os detalhes da primavera:
Sua flor é um belo misto
De cores e curvas em quimera.

E, persisto nos detalhes,
Verás: o tão branco é o seu botão.
Então, faça, afaste as folhagens
E entenderás minha paixão.

Em nenhuma outra prima, uma flor
Se abre tão rapidamente
Quanto esta, num estalo!

Que de tão perto, a mesma sente
A aproximação de outro talo,
É a minha primavera em seu sabor.

- Ora pois, disse o Boca, isto mi’cheira a sacanagem!!!
- É Boca, Porra!!, você não viu, é a minha prima chamada Vera a quem vos falo!!! – esclareço.

hahahahahahahah.....
ahahahahahahah.....

O Boquinha, de doer o estômago, apóia-se em mim para sentar na calçada, puxa-me e me olha dizendo:

- Muito boa...
-Que, A piada? – pergunto
-A prima, ora bolas? – esbraveja, ri e emenda:
- EMRIQI, veja esta, já escrevestes para Onam?
- Ah sim – respondo - todo dia dou-lhe a palavra!!!!”
– ahahahahahh,
Gregório dá um gole na botilla. “Veja então...”, toma um ar, e manda:

NECESSIDADES FORÇOSAS DA NATUREZA HUMANA

Descarto-me da tronga, que me chupa,
Corro por um conchego todo o mapa,
O ar da feia me arrebata a capa,
O gadanho da limpa até a garupa.

Busco uma Freira, que me desentupa
A via, que o desuso às vezes tapa,
Topo-a, topando-a todo o bolo rapa,
Que as cartas lhe dão sempre com chalupa.

Que hei de fazer, se sou de boa cepa,
E na hora de ver repleta a tripa,
Darei, por quem ma vaze toda Europa?

Amigo, quem se alimpa da carepa,
Ou sofre uma muchacha, que o dissipa,
Ou faz da sua mão sua cachopa.


- Hey Gregório – exalto - que beleza!!!
Eu tenho um recado a Onam, também:
Saio à atropelada num círculo na rua, e declamo:

PUNHETA

Poeta ser solitário,
Punheta em pensamentos a companhia
Tua.

Às vezes, o poeta punheta
A arte, o conhecimento
E, de tanta beleza em seus olhos, também punheta.

Pobre poeta, pobre,
Punheta a dor e fazpede para parar.
E declama: Punheta não, punheta não!

Dono das árvores, do sol,
Dos bichos nos postes fios condutor,
Dono de tudo, meu poeta, respondes:

"De tudo e de nada,
Faço tudo e fica nada,
Mas eu punheto, bem punheto".

- Ora EMRIQI, muito bom, gostei!!! – disse o Boca – ajude-me a levantar... o boteco já vai fechar. Vamos bater pé por lá.

“Viva o Boca!!!”- exclamei. Hahaha...

No bar, depois de tanto empenho na arte da vadiagem, a sorrir para a Lua, que está nova, meio escondida, Gregório abre a sessão novamente:
-EMRIQI, vou fazer jus a meu nome... segure esta. E Gregório lançou:

À DESPEDIDA DO MAU GOVERNO QUE FEZ ESTE GOVERNADOR

Senhor Antão de Sousa de Meneses,
Quem sobe a alto lugar, que não merece,
Homem sobe, asno vai, burro parece,
Que o subir é desgraça muitas vezes.

A fortunilha autora de entremezes
Transpõe em burro o Herói, que indigno cresce
Desanda a roda, e logo o homem desce,
Que é discreta a fortuna em seus reveses.

Homem (sei eu) que foi Vossenhoria,
Quando o pisava da fortuna a Roda,
Burro foi ao subir tão alto clima.

Pois vá descendo do alto, onde jazia,
Verá, quanto melhor se lhe acomoda
Ser home em baixo, do que burro em cima.

E a patota toda zoava da Vocênhoria, e alguns emendavam piadas e outros defendiam-no.
Eu coloquei: - Eu não gosto de hipocrisia: um dia havia dois amigos a falar mal e contar galhardias da mulher de um terceiro amigo.

Ali... ali mesmo naquela mesa...
Aproveitei para escrever num guardanapo e enviei pelo Manoel pros marmanjos. Dizia:

CONVERSA DOS NAMORADOS

Você fala de boca cheia
Da sua vizinha, dessa vida alheia,
Pro seu amigo que ri, e não confessa,
Que o seu problema tá maior que essa.

Você que há muito nesta conversa induz,
A mostrar-se um quase-perfeito garanhão,
Queres o teu amigo que te seduz!
Queres comer com a bunda na sua mão!

Então, não venha com este papo furado,
Estou de fora e vejo: és tão homossexual
Quanto o fulano que tu tanto falas mal.

Pois, fantasmas nesta área, muitos têm.
E, assim como falas, queres comer alguém.
E, por orgulho, não queres aparentar pro amado.

- Opa! Que queres dizer com isto, gajo?! – Gregório me olha espantado.
- Ahahaha, Porra Boca, fala sério...sou da psicanálise...ahahahahahahaha
- Reichiana!!!.... emenda o danado.

Lá pelas tantas, o Boca resolve ir embora, que amanhã se encontrará com Maria dos Povos, mas antes, recomenda-me para não escrever estas coisas no meu Blog, “pode queimar teu filme... vão achar que és viado!!!”, “ahahahahahahahah”, “Mas é sério – e recomenda:

CONTEMPLANDO AS COISAS DO MUNDO DESDE O SEU RETIRO

Neste mundo é mais rico, o que mais rapa:
Quem mais limpo se faz, tem mais carepa:
Com a sua língua ao nobre vil decepa:
O Velhaco maior sempre tem capa.

Mostra o patife da nobreza o mapa:
Quem tem mão de agarrar, ligeiro trepa;
Quem menos falar pode, mais increpa:
Quem dinheiro tiver, pode ser Papa.

A flor baixa se inculca por Tulipa;
Bengala hoje na mão, ontem garlopa:
Mais isento se mostra, o que mais chupa.

Para a tropa do trapo vazo a tripa,
E mais não digo, porque a Musa topa
Em apa, epa, ipa, opa, upa.

Ahahahahahahah.....
E o Boca me dá uns tapinhas nas minhas costas, e diz: "Tchau, até más",“Manoel, quanto saiu?”.
O Manoel, dono do bar, diz que a conta já foi paga.
Eu ainda fico, para curtir mais um pouquinho, amanhã é folga.

“Tchau Boca!!!”

Para conhecerem mais poemas de Gregório de Matos e Guerra, tem estes sítios:

http://www.cce.ufsc.br/~nupill/literatura/gregorio.html

http://www.revista.agulha.nom.br/grego.html

E para os poemas de EMRIQI, continue a acompanhar este blog.