sábado, dezembro 01, 2007

Trago Dois Poemas meus ( cont...)

O primeiro poema revela uma foto da estética dionísiaca, escrita por Nietzsche. Este segundo poema, revela a estética apolínea, também muito singular a Nietzsche.

VERSOS

Que maravilha são os versos !
Às crianças devem educar,
Da poesia fazer-se servos,
A vida a viver e a melhorar.

Mas, do verso que traz o amor,
Traz também o gume afiado
Que talha na alma, a flor,
Ao Fim cru, dolorido e cansado.

Nos versos não há valor.
Os versos trazem a natureza
Das cantigas de beleza e de dor,
Do ser que aguça, outro reza.

Uma essência do verso é cantar,
E viver alto para o espirito,
Como a harmonia crua do mar,
Ou na catarse humana do rito.

Voltemos, Ó seres da sorte, ao verso !
Traga cor e movimento ao lar!
Enfeite a cidade em seu inverso,
Talhando co' mercantil, jogo de azar.

Que maravilha são os versos !


Podemos ver alguns aspectos principais que traz a marca apolínea. Primeiro, se trata de uma poesia que traz contribuição ao grego, a favor de um melhoramento, pois trata da educação pela poesia, ensinando que nela não há o valor ( do bem e do mal distintamente). Deste modo, é uma poesia nobre, poesia grega. Fazer-se servos da poesia indica uma servidão diferente da que com Deus, ou outro Pai qualquer. O compromisso é com a arte, que é humana. Ao fim cru, dolorido e cansado indica algo que Nietzsche salientou, que a poesia de Homero se deu sob a aparência (apolínea) da incorporação da natureza e suas forças (os Titãs, concepção pré-olímpica) pela arte e seus sentidos, dando um lugar a Dionísio ( que é a força, a licensiodade sexual, as festas sexuais, a unidade com a terra, sua desindividualização) no hegemônico mundo apolíneo, que tinha pavor, medo da morte, desta desindividualização. Com a poesia de Homero, dado por esta aparência, se perdeu a Era dos Titãs, a era heróica, dando um lugar as lamentações que é a própria condição da não-potência frente a natureza. Eu vejo que Nietzsche traz muito do contexto moderno que ele viveu para esta leitura, pois o que ele fez foi uma genealogia da arte grega, como se embrenhou na condição grega. No prefácio do livro ele é muito criticado, pois seu ponto de vista se mistura com seu objeto de estudo, não que seja um problema, mas perde um pouco da validade, mas não o deixa de ser intrigante e um material muito bom e rico para se trabalhar. Estou concordando com isto.
Voltando ao poema, Os versos trazem a natureza, indica esta imitação da natureza e controle dela, nada mais apolíneo.
Vejam:

Uma essência do verso é cantar,
E viver alto para o espirito,
Como a harmonia crua do mar,
Ou na catarse humana do rito.

Aqui mostra a atitude grega com a arte, elevando-a a um bem comum, de todos, elevando –a aos Deuses, criados pela imaginação grega para superar a existência de seu mal-estar, e dando um sentido humano às divindades que possibilitassem agora deles agirem conforme a estética/ética humana. O dever com os Deuses (espelho dos humanos) é o dever com os humanos, o liberando de viver uma vida rica, artística, humana, num separação/superação da natureza, da força dos Titãs. Esta separação se dá pelo pavor (da força sexual dionísica onde o corpo se perde na unidade). Vale lembrar que o Deus Dionísio (que é diferente desta força dionisíaca bárbara) é o Deus das Festas, do Teatro. Acho que é neste lugar que Nietzsche chama a atenção. O mundo apolíneo seqüestraria esta força, dando um lugar a Dionísio como a força dos Titãs (acho eu). Esta estrofe mostra que o apolíneo venceu, captando para os sentidos a força da natureza. Diminuindo sua força. Igualar o espírito com a força do mar, acredito eu que é colocar na cena esta força da natureza, na imaginação, nada mais apolíneo.

Dá para perceber a diferença dos dois poemas. Um se volta na força dos instintos, com o foco mais na potência dos membros, dos músculos, do enfrentamento, do animal e outro se faz na possibilidade da catarse na arte, na poesia, na música.
E realmente, eu estava vivendo poesia nesta época. Eu morava na praia, pedalava, e na universidade, o nosso grupo, fazía muita arte. Muitos estavam vivendo nela, lembro do Poeta Cesinha que era referência dos movimentos, do músico Iê, que andava pela universidade tocando sua flauta e tocando pandeiro, das danças femininas das mulheres, a Laila, a Fernanda (começando o Arrasta Ilha), a Bicicletada, o pessoal das ciências sociais, Bené, Leozão, Japa, O Luciano Índio da filosofia, amigão, estava em todas, do Ninno e sua risada que estremecia a caretice do movimento estudantil pró-revolução russa, da galera da Rádio de Tróia vendendo cerveja sem copo descartável, cada um trazia sua caneca; estávamos todos incluídos em todos estes movimentos. O ambiente era o Bosque do CFH, no teatro de arena. Uns faziam malabares, outros batiam uma bolinha. O ambiente era limpo e transparente como uma festa Apolínea. E era mágico, era muito gostoso, eu tinha uma alegria imensa. Apresentei estes versos, foi o primeiro lugar que apresentei. Acho que nem eu valorizei tanto, apesar de que sabia que havia riqueza nele. Que saudade, que tempo!! Esse nosso grupo teve coesão no DCE 2001, onde era uma esperança de fazer política estudantil. Mas, os frutos doces, vermelhinhos, só se deram depois, com a proposta do fazer sem instituição e congregou a todos, num movimento muito bonito e orgânico, vivo ainda hoje. Então não falo do passado, e sim de agora.

Vejam que, apolíneo, dionisíaco, vai para além do bem e do mal, não se enganem com teorias ortodoxas, onde o domínio da natureza é ruim e que o fera é ser animal, natural. Nada mais apolíneo que isto. E nem, que a nossa energia esta na sublimação cultural, da arte. Nada mais europeu, sem o sangue efervescente do chão latino-americano. Nem que a verdade, as respostas estão na lógica e o catarse está no rito. Nada mais cindido que isto!! Leiam “A Origem da Tragédia” e verão um belo ensaio que traduz muito do que passamos agora na (pós) modernidade. Não basta eu colocar aqui, o que é Dionísio e o que é Apolo (Deus da Forma, da Arte, da Guerra). Dionísio é esta força das entranhas, a perdição de si no prazer, o caos, vinculado a terra. Outro livro ótimo é da Camile Paglia “Personas Sexuais: de Nerfetite a Emily Dickson”.

Quis mostrar um pouco o contexto em que estava com o valor da poesia e dizer que ambas remete a estética de que Nietzsche refletiu dos gregos.

Arrevoá-aaa Baco!!!!

4 comentários:

Anônimo disse...

comentários do Ninno por email:
"salve Henrique!!
que beleza!
obrigado pela prazeirosa leitura que me proporcionou esse texto que
mandou!!
parece que estava no trem com vc e o Rafa...
e esse primeiro poema hein!
maravilha mermão!!
gostei muito dos dois, e dos comentários pedagógicos sobre o
segundo... puxa, uma aula sobre apolo e dionísio!
mas o que mais me tocou e chocou foi o primeiro!!
e como está a vida em POA??
muita capoeiragem?
conheceu a galera do Oi Nois Aqui Traveis?
Henrique,
novamente brigadão pelos poemas e pelo texto!
muito bom começar a semana desse jeito!!
grande abraço!
Ninno
"

Anônimo disse...

Valeu Ninno, fico feliz com isto. Viajando no meu poema, eu vejo que está perfeitamente de acordo com que Nietzsche fala das duas estéticas. O primeiro poema é a força dionisíaca no mar apolíneo. Pra começar, o título "humano Demasiadamente Desumano", indica que há uma humanidade/desumanidade. Como a força dionisíaca bárbara que é diferente de Dionísio grego, creio eu que a unidade é maior que esta distinção humanista, mas mesmo desta maneira, Dionísio não perde a sua força, como diz Nietzsche, há uma mistura. Neste dá para ver o lado humano, quando a necessidade é força irracional para as ações com base na saciedade, onde se luta para sobreviver. então é absolutamente Dionísio por não ser puramente dionisíaco.

Anônimo disse...

Voltemos, Ó seres da sorte, ao verso.
Mais grego que isto, impossível: Homero registrou a saga dos heróis e dos Deuses em 12.000 versos. Voltemos a eles!!!!

Ninno Biomassa disse...

aeh!!
valeu postar o comentario!
e obrigado pela lembrança da risada que tremia o movimento estudantil da esquerda-fachada!!
to rindo sozinho!!!
abração-irmão!